DVD - Chico Buarque - Que Tal um Samba? Ao Vivo
Marca: Chico BuarqueModelo:Que Tal um Samba? Ao Vivo Lançado em: 09/07/2024
DESCRIÇÃO
EM QUE TAL UM SAMBA? (AO VIVO), CHICO BUARQUE RELÊ O PAÍS AO PROPOR NOVOS DIÁLOGOS DENTRO DA PRÓPRIA OBRA
Claudio Leal
Em 2022, Que tal um samba? fazia um convite hedonista no meio da travessia de horrores. Chico Buarque propunha um samba para o desconjuro da maré de fascismo e pandemia, ou de pura “demência”, e nos fazia pensar em sua trajetória renovadora nesse gênero musical. Outra vez, Chico condensava a história do samba e a volta por cima da história, prevista por ele entre pavores e prazeres, como se desafiasse o país a evoluir junto com a sua linha melódica. Nas imagens do banho coletivo de sal grosso, os jogos poéticos buarqueanos absorviam a língua das ruas, com rimas engenhosas, e punham a negritude e a cultura popular como obstáculos à “força bruta”.
O que temos com o DVD e o CD duplo e digital Que Tal um Samba? (Ao Vivo), gravados pela Biscoito Fino no Vivo Rio em 3 e 4 de fevereiro de 2023, é a resposta de Chico Buarque a essa travessia de “inferno e maravilhas”, recorrendo ao seu cancioneiro de voo universal, uma janela ampla para o mundo. No roteiro de 31 faixas, o compositor reúne músicas sem rugas do tempo e de significados novos quando espelhadas umas nas outras, acentuando o desenho de sua arte inclinada a inumeráveis jogos de armar. Todas as canções de longa idade ganham expressão inédita em sua releitura dinâmica. Para mover a história, Chico dispõe de canções de dimensão social e individual, política e romântica, dentro de uma poética transformadora da lírica brasileira. Essa mestria se confirmou ainda outro dia com Tua cantiga, seu lundu com Cristovão Bastos, uma aliança de forma ancestral e linguagem moderna.
O show “Que Tal um Samba?” reflete seu tempo histórico numa poética atemporal e reafirma o impulso de Chico Buarque em redimir os humilhados e as belezas de uma civilização ameaçada. Não há desconversa. As tensões surgem com “Todos Juntos”, sua versão para a peça infantil Os Saltimbancos (Sergio Bardotti e Luis Bacalov), “Passaredo” (com Francis Hime), “Sinhá” (com João Bosco), “Assentamento”, “Bancarrota Blues” (outra com Edu), “O Meu Guri”, “As Caravanas”, “Deus lhe Pague” e “Que tal um samba?”. Nessas canções, encaixadas em pontos exatos, sobrevoamos o medo ambiental, a crueldade fundadora do Brasil, o esculacho na população negra, o ressentimento dos injuriados e a maternidade trágica das periferias. Mas aflora a reação aos desconcertos. E a brisa de “Bom Tempo”.
Algumas canções causam estranheza por remeterem menos ao passado em que foram compostas do que à inquietação com o futuro. Mar e Lua, o retrato dramático de um amor lésbico, do álbum Vida (1980), renasce nova em folha num período de cerco e repressão a casais homoafetivos. Pouco a pouco, Chico reitera as ideias e imagens de Sinhá e As Caravanas, das mais fortes canções da música brasileira contemporânea, lançadas nos discos de 2011 e 2017. Ele não esquece, porém, a trilha amorosa e o próprio fato de sua obra ser uma razão do nosso encanto pelo mundo, bem como um parâmetro de beleza e verdade na língua portuguesa. Assim, não sem espanto, chegamos à virtuosidade de Noite dos Mascarados, Sem Fantasia, João e Maria, Biscate, Choro Bandido, Sob Medida, Bastidores, Imagina, Samba do Grande Amor, Beatriz e Injuriado.
Na turnê, ao dividir o palco com Mônica Salmaso, Chico estreitou o diálogo da cantora paulista com a sua obra, manifestado em álbuns como Voadeira (1999) e Noites de Gala, Samba na Rua (2007), este último totalmente dedicado ao repertório buarqueano, com uma regravação modelar de Beatriz. Um ano antes, no álbum Carioca (2006), Chico convidara Salmaso a participar da faixa Imagina, uma de suas parcerias com Tom Jobim. Desde 1975, o ano do disco e show com Maria Bethânia, o compositor não dividia um projeto com uma intérprete.
A presença de Salmaso estimulou as expressões teatrais de Chico, mais solto nos duos e solos, e ergueu uma ponte entre a alma carioca do compositor e a musicalidade dos paulistas. Em mais de um plano, o show festeja o canto feminino, pois ainda homenageia Gal Costa (1945-2022), evocada em Mil Perdões, e Miúcha (1937-2018), com Maninha, o mergulho ficcional do cantor na infância com a irmã, além de tudo sua cúmplice nos primeiros estudos do violão da bossa nova.
Chico entra em cena no momento em que Salmaso canta Paratodos, uma tirada de chapéu à sua genealogia musical e um evoé aos mestres do futuro. Sem alarde, Paratodos marca outro vínculo, o de Chico com o maestro Luiz Cláudio Ramos, tradutor discreto e profundo de sua cabeça musical, continuando um diálogo iniciado há 50 anos, na gravação de Bárbara para o disco Calabar (1973), que teve arranjos de Edu Lobo. Adiante, Ramos ajudou a conceber as harmonias do show de Chico & Bethânia e fez o arranjo para orquestra de Mulheres de Atenas, em Meus Caros Amigos (1976). No Chico Buarque de 1989, ele elaborou a maioria dos arranjos, mas só a partir de Paratodos (1993) assumiu a direção musical dos discos e shows. Sua colaboração ressalta as afinidades harmônicas com Chico e o entendimento de seu processo criativo.
Esse período de felicidade musical, sob a regência de Luiz Cláudio Ramos (arranjos, guitarra e violão), inclui a banda formada por João Rebouças (piano e cavaquinho), Jorge Helder (baixo, violão e bandolim), Jurim Moreira (bateria), Chico Batera (percussão), Bia Paes Leme (teclado e voz) e Marcelo Bernardes (sopros).
Na cenografia de Daniela Thomas, 25 imagens de fotógrafos brasileiros – Araquém Alcântara, Sebastião Salgado, Thereza Eugênia, Cristiano Mascaro, entre outros – traduzem a imaginação dos temas buarquianos. A escuta contemporânea de música, quase sempre sem atender à ordem ou integridade de um álbum nos aplicativos de celulares, não apaga a importância de discutir o pensamento de um show. E o registro em vídeo ajuda a prolongar a experiência de um espetáculo musical em sua complexidade.
Em 1968, num texto publicado no fervor dos festivais, Chico afirmou que “a música brasileira, ao contrário de outras artes, já traz dentro de si os elementos de renovação”. No pós-bossa nova, como brilhante discípulo de Tom Jobim, ele encontrou no samba um chão fertilizado para seu sopro moderno. Aos 79 anos, pode operar a renovação mobilizando seu próprio repertório, um continente a ser revirado. Dois álbuns anteriores ressoam no cd ao vivo. De Francisco (1987), saíram “As minhas meninas”, “Bancarrota Blues” e “O velho Francisco”. E de Paratodos vieram “Choro bandido” (com Edu Lobo), “Biscate”, “Futuros amantes”, além da faixa-título do disco. Nesses pontos de sua discografia, apesar das diferenças evidentes na sonoridade, emergem a revisão crítica da tradição e o autorretrato real ou imaginário do artista no tempo.
Do coração de uma obra que revisa a si mesma, seu olhar se expande para o mundo. “Que tal um samba?” foi ao mar, ao batuque, ao futebol, à pele escura da “Beleza pura”, de Caetano Veloso, e desmantelou a “força bruta” antes purgada em “Cálice”. Na apresentação ao vivo, Chico incorpora citações do “Samba da Benção”, de Baden Powell e Vinicius de Moraes, e do “Samba da Minha Terra”, de Dorival Caymmi, situando o gênero na vanguarda da alegria saneadora. Sua consciência histórica assume lugar na filiação ao samba.
Que Tal um Samba? (Ao Vivo) resultou de uma intervenção crítica na música e na história. Em seu arco de cores, o canto de Chico Buarque preserva a suavidade na expressão de violências e explora as inflexões da fala. Impossível não lembrar sua canção “Tempo e Artista”, em que “o velho cantor, subindo ao palco/ apenas abre a voz, e o tempo canta”. Nesse show, o tempo cantou uma vez mais por Chico e desatou muitos nós na garganta.
FAIXAS
1. TODOS JUNTOS
Interprete: Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque / Luis Bacalov / Sergio Bardotti
Editora: Marola Edições / Cetra (Warner Chappell)
2. MAR E LUA
Interprete: Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
3. PASSAREDO
Interprete: Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque / Francis Hime
Editora: Marola Edições / Vermelha (Nossa Música)
4. BOM TEMPO
Interprete: Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
5. BEATRIZ
Interprete: Mônica Salmaso
Autoria: Edu Lobo / Chico Buarque
Editora: Lobo Music (Abramus) / Marola Edições
6. PARATODOS
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
7. O VELHO FRANCISCO
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
8. SINHÁ
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque / João Bosco
Editora: Marola Edições / Zumbido (Sony Music Publi.)
9. SEM FANTASIA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
10. BISCATE
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
11. IMAGINA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Antonio Carlos Jobim / Chico Buarque
Editora: Jobim Music / Marola Edições
12. CHORO BANDIDO
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Edu Lobo / Chico Buarque
Editora: Lobo Music (Abramus) / Marola Edições
13. SOB MEDIDA
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
14. BASTIDORES
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
15. MIL PERDÕES
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
16. SAMBA DO GRANDE AMOR
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
17. INJURIADO
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
18. TIPO UM BAIÃO
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
19. AS MINHAS MENINAS
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
20. UMA CANÇÃO DESNATURADA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
21. MORRO DOIS IRMÃOS
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
22. FUTUROS AMANTES
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
23. ASSENTAMENTO
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
24. BANCARROTA BLUES
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Edu Lobo / Chico Buarque
Editora: Lobo Music (Abramus) / Marola Edições
25. TUA CANTIGA
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Cristovão Bastos / Chico Buarque
Editora: Copyrights Consultoria / Marola Edições
26. MEU GURI
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
27. AS CARAVANAS / CITAÇÃO: DEUS LHE PAGUE
Interprete: Chico Buarque
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
28. QUE TAL UM SAMBA? / CITAÇÃO: SAMBA DA BENÇÃO / CITAÇÃO: O SAMBA DA MINHA TERRA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque / (Baden Powell / Vinicius de Moraes) / Dorival Caymmi
Editora: Marola Edições / Tonga (Universal Music Publi.) / Mangione Filhos & Cia
29. MANINHA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
30. NOITE DOS MASCARADOS
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque
Editora: Marola Edições
31. JOÃO E MARIA
Interprete: Chico Buarque e Mônica Salmaso
Autoria: Chico Buarque / Sivuca
Editora: Marola Edições / Cara Nova (Arlequim)